Por Angelo Castro*
É no mínimo estranho a prefeitura de São Bernardo do Campo não querer auditar a Parceria Público-Privada (PPP) do lixo. Se o concessionário dos serviços de limpeza urbana, o consórcio SBC Valorização de Resíduos, afirma nada ter a esconder, o que impede o município de realizar uma profunda análise do contrato, por meio de auditoria independente? A resposta é óbvia: as conclusões mostrariam não haver razões técnicas para o questionamento ou rompimento unilateral do contrato, evidenciando que as intenções do Poder Executivo municipal estão acima do bem, da razão e do interesse público.
O mais grave é que seriam os contribuintes que arcariam com a conta de uma rescisão unilateral, pagando o pato por uma decisão sobre a qual não foram consultados. E a indenização é elevada, atingindo valor superior a R$ 300 milhões, segundo estudos independentes já realizados.
Infelizmente, presenciamos, ao longo dos anos, em boa parte dos governantes brasileiros, esse tipo de atitude que agora vem se observando na prefeitura de São Bernardo. O poder da caneta transforma e a intransigência e arrogância prevalecem sobre o bom senso e o racional.
Acompanhamos o andamento da CPI do Lixo na Câmara Municipal. Observamos que os vereadores estão com um grande problema, pois está difícil corroborar a postura da equipe da prefeitura. Seus integrantes inflam o peito para falar de “inúmeras” irregularidades e abriram processo administrativo para investigar a PPP, mas nada evoluiu até o momento. Todos os depoimentos prestados até agora não comprometem a sua correção. Ao contrário! Assim, se o propósito era “implodir” o contrato, faltam elementos para sustentar a missão!
Todos os argumentos da prefeitura para cancelar o contrato e não efetuar os pagamentos devidos à empresa estão fundamentados em relatório de investigação elaborado pelo TCE – Tribunal de Contas do Estado de São Paulo. Ora, em cada 10 PPP’s no País, 11 são investigadas pelos respectivos tribunais de contas, cuja atribuição é observar se os recursos públicos estão sendo bem aplicados. No entanto, ainda não há relatório conclusivo, apenas apontamentos a serem verificados. As contas do governo municipal de São Bernardo também serão fiscalizadas pelo TCE. Por mais competente que seja a equipe do Paço Municipal, o mais provável é que haja ressalvas e apontamentos de irregularidades. Nesses casos, a prefeitura tomará esses apontamentos como verdade absoluta ou irá defender-se? É o que está fazendo a SBC Valorização de Resíduos, a partir de sua certeza de que nada há de irregular, ao defender a realização de auditoria independente.
Voltando à CPI do Lixo, nem todas as respostas estão no passado. Existem três elementos do presente que poderiam esclarecer muita coisa para os vereadores. São eles, a agência reguladora, a Secretaria de Serviços Urbanos e a Procuradoria do Município. A primeira, criada por lei municipal, tem dentre suas principais atribuições, a de regular conflitos entre os parceiros da PPP. Na prática, porém, está agindo como assessoria técnico-jurídica da prefeitura, defendendo exclusivamente as decisões políticas. O próprio TCE já identificou essa interferência politica.
A esta altura do ano, já no final do primeiro semestre, a Secretaria de Serviços Urbanos já teve tempo de sobra para se posicionar sobre os benefícios ou imperfeições do contrato e avaliar se a limpeza urbana está cara ou barata? Se a prefeitura decidisse contratar separadamente todos os serviços prestados pela concessionária ficaria mais barato? As respostas a essas questões são cruciais para a sociedade, e a pasta tem plenas condições de esclarecer tudo, mas ainda não o fez. Sabemos extraoficialmente que o levantamento de custos já foi realizado e que a contratação separada dos serviços custaria mais caro para o município. Não divulgar isso reforça a sensação de que o desejo do executivo municipal está acima do bem, da razão e do interesse público.
O terceiro elemento ainda não explorado pela CPI é a Procuradoria do Município. Logo nas primeiras semanas do novo governo municipal, o órgão emitiu relatório recomendando a nulidade do contrato, o não pagamento das faturas mensais e a contratação emergencial dos serviços de limpeza urbana. O que não foi feito ainda, por efeitos de decisão judicial que proíbe tal excrecência e absurdo. Ora, essa mesma procuradoria, nos primeiros anos da PPP, homologou reajustes, aprovou aditivos e defendeu o contrato perante o TCE. Agora, pela simples mudança de gestão, mudou suas opiniões? Percebam o problema do ponto de vista da segurança jurídica para os contratos. O mesmo procurador do município que aprovou a PPP, reajustes e aditivos assina relatório recomendando o cancelamento. Não vai demorar para ser criado um “custo São Bernardo” para todos os contratos do município. Todo fornecedor vai “embutir” um valor de risco para prestar serviços à prefeitura.
A SBC Valorização de Resíduos sempre esteve à disposição para prestar todos os esclarecimentos necessários. Pesquisas de satisfação da sociedade e da própria administração municipal evidenciam a qualidade dos serviços. No entanto, a inadimplência da prefeitura chegou a níveis insustentáveis. Fornecedores recusam-se a atender sem os devidos pagamentos. Temos uma estrutura de 900 colaboradores, 100 equipamentos e duas centrais de reciclagem que dependem exclusivamente dos recursos municipais para se manter. Por tudo isso, não é possível que o interesse político prevaleça sobre o bem comum e dos munícipes que pagam seus impostos. Não é justo que o contribuinte pague essa conta. Por isso, insistimos na pergunta: por que não submeter a PPP a uma auditoria independente?
*Ângelo Castro é diretor executivo da SBC Valorização de Resíduos.